O acórdão analisou a constitucionalidade da Lei de Terceirização (Lei 13.429/2017).
AÇÃO
ADI 5685
TESE
Constitucionalidade da Lei de Terceirização (Lei 13.429/2017).
ANDAMENTO
Decisão transitada em julgado
RELATOR
Ministro Gilmar Mendes
PARTE REQUERENTE
Rede Sustentabilidade
EMENTA
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. 2. LEI FEDERAL 13.429/2017. TRABALHO TEMPORÁRIO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO A TERCEIROS. 3. TERCEIRIZAÇÃO DA ATIVIDADE-MEIO E DA ATIVIDADE-FIM. TERCEIRIZAÇÃO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. 4. AUSÊNCIA DE INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL E MATERIAL. PRECEDENTES: ADPF 324, REL. MIN. ROBERTO BARROSO, E RE-RG 958.252, REL. MIN. LUIZ FUX. 5. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA IMPROCEDENTE.
OBJETO
O pedido é a declaração de inconstitucionalidade da Lei 13.429, de 31 de março de 2017, que altera dispositivos da Lei 6.019, de 3 de janeiro de 1974, sobre trabalho temporário em empresas urbanas e sobre relações de trabalho em empresas de prestação de serviços a terceiros.
APENSADAS POR PREVENÇÃO
ADI 5.685; ADI 5.686; ADI 5.687; ADI 5.695; ADI 5.735
PRINCIPAIS ATOS E PEÇAS DECISÓRIAS
ANDAMENTO COMPLETO
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS, EM 22/09/2020
INTEIRO TEOR DO ACÓRDÃO, EM 21/08/2020
DECISÃO - TRIBUNAL PLENO - SESSÃO VIRTUAL, EM 16/06/2020
DECISÃO MONOCRÁTICA, EM 15/03/2019
MANIFESTAÇÃO DA PGR, EM 11/07/2017
DECISÃO MONOCRÁTICA, EM 18/04/2017
PROTOCALADA EM 03/04/2017
FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO
(os fundamentos ora apresentados correspondem na íntegra ao resumo do acórdão)
O acórdão remete ao voto do relator, ministro Gilmar Mendes, identificando-se tais fundamentos:
Impende destacar, ainda, que, nesse cômputo dos custos de transação, a eficiência é um dado significativo. É que a externalização transfere etapas da produção para outros agentes que normalmente são especializados naquela específica etapa produtiva. A terceirização é justamente um consectário desse modelo descentralizado, externalizado. E, se as bases socioeconômicas são outras, é inevitável que tenhamos que conformar a disciplina em torno delas.
Se a Suprema Corte americana impôs freios a opções políticas definidas pelo legislativo, por aqui, o TST tem colocado sérios entraves a opções políticas chanceladas pelo Executivo e pelo Legislativo. Ao fim e ao cabo, a engenharia social que a Justiça do Trabalho tem pretendido realizar não passa de uma tentativa inócua de frustrar a evolução dos meios de produção, os quais têm sido acompanhados por evoluções legislativas nessa matéria.
A vedação à terceirização de etapas produtivas relacionadas à atividade-fim não passa de um controle artificial, e inócuo, do mercado e das relações trabalhistas. Impõe-se um ajuste jurídico no sentido da eliminação dessa barreira ao crescimento e ao desenvolvimento do mercado e do trabalho, medida que, em vez de enterrar o trabalho, certamente o fortalecerá.
Logicamente, a prática da terceirização coloca em xeque conceitos basilares do Direito do Trabalho tal qual o conhecemos. Será preciso, portanto, refundar o Direito do Trabalho, instaurando novos pontos de ancoragem ou, no mínimo, reformulando os seus mais fundamentais conceitos. Também a Justiça do Trabalho estará diante do grande desafio de coibir abusos, nomeadamente o uso ardiloso da terceirização como expediente de pulverização da cadeia produtiva com vistas a impedir, em qualquer altura do processo produtivo, que alguma empresa arque com os direitos trabalhistas envolvidos.
É claro que a utilização de serviço temporário pela administração pública não pode configurar, jamais, burla a exigência de concurso público. No entanto, observada a legislação pertinente, deve o gestor, no exercício de sua competência, optar pela melhor forma de atender o interesse público e a eficiência administrativa, podendo se utilizar da contratação de empresas de serviço temporário.
FUNDAMENTOS DO VOTO DO MIN. GILMAR MENDES (RELATOR)
Das alegações de inconstitucionalidade formal da Lei 13.429/2017
No que tange à violação às regras do procedimento legislativo, entende que a tramitação seguiu as disposições dos arts. 104 e 105 do Regimento Interno da Câmara de Deputados, bem como, apresenta que o STF já firmou entendimento de não ser possível ao Poder Judiciário a análise ou modificação às previsões regimentais de organização procedimental das Casas Legislativas.
Das alegações de inconstitucionalidade material da Lei 13.429/2017
Direito do Trabalho e mudanças socioeconômicas
O ministro entende que é importante conhecer a terceirização a partir das mudanças socioeconômicas, sendo que a “pretensão de releitura do trabalho, do mercado e do direito do trabalho não resulta uma fragilização e uma precarização desses temas”. Então, rememora que o modelo de produção fordista, caracterizado pela centralização das etapas produtivas, moldou a relação de emprego (objeto do Direito do Trabalho). No entanto, com as alterações socioeconômicas, surgiram novos modelos flexíveis e descentralizados diversos daquelas que assentaram as bases principiológicas do Direito do Trabalho. Ao se fundamentar em Ronald Coase, em uma análise de custos de transação e o processo de externalização, o ministro diz que no sistema jurídico existe “mais um vetor de ampliação de custos”, uma vez que a empresa “não conseguirá se conduzir de acordo com os custos de transação trazidos pelo mercado em si”.
Atividade-fim versus atividade-meio
Reflete a dificuldade em distinguir uma atividade que seria meio ou fim ao trazer o entendimento da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal, a qual concebe que “em uma economia cada vez mais especializada e competitiva, seria impossível que um auditor, procurador ou juiz soubesse determinar quais atividades são fim ou meio para cada segmento da economia”. Desse modo, conclui que a Súmula 331 do TST está em dissonância da realidade empresarial e econômica ao aplicar um critério “à luz do subjetivismo”. Ainda salienta que existe “um embate entre o teor da lei e a recusa de sua aplicação por parte de um tribunal superior, o que soa como ativismo judicial. Parece-me que aqui temos uma Era Lochner às avessas”.
Súmula 331 do TST
Elenca que o modelo de direitos sociais no Brasil são frutos de uma cultura paternalista. O Direito do Trabalho, ainda marcado pela visão marxista de luta de classes, demoniza o capital, “uma ideologia que impregnou” a Constituição Federal, uma vez que, ao trazer o entendimento de Roberto Campos, “a cultura que permeia o texto constitucional é nitidamente antiempresarial”. Ressalta ainda que a Constituição colocou lado a lado os princípios da ordem econômica e da valorização do trabalho, sendo a prática da terceirização uma materialização da necessidade que o Direito do Trabalho tem que se “refundar” e a Justiça do Trabalho atuar na coibição de abusos pelo uso ardiloso da terceirização.
Consequências da intermediação da mão de obra
A flexibilização, para o ministro, resulta em aumento nos níveis de ocupação e traz ganhos sociais, de modo que “a vedação à terceirização de etapas produtivas relacionadas à atividade-fim não passa de um controle artificial, e inócuo, do mercado e das relações trabalhistas”.
Flexibilização e direito comparado
Aborda a onda de reformas trabalhistas pelo mundo como uma resposta à necessária flexibilização das normas trabalhistas. Como argumento, traz uma pesquisa realizada por Ives Gandra Martins sobre a redução da taxa de desemprego na Alemanha, Espanha, França, Itália e Portugal, em que se deve a flexibilização como um dos fatores. A partir de dados do IBGE, apresenta uma redução da taxa de informalidade pelo crescimento do trabalho informal e desenvolvimento do comércio. Dessa forma, “aqui não se trata de optarmos entre um modelo de trabalho formal e um modelo de trabalho informal, mas entre um modelo com trabalho e outro sem trabalho”.
Terceirização e concurso público
Entende que a legislação está em consonância com as disposições constitucionais, “portanto, a contratação de empresa de serviço temporário para terceirizar o desempenho de determinadas atividades dentro da administração pública não implica em violação à regra do concurso público, uma vez que não permite a investidura em cargo ou emprego público, devendo a Administração observar todas as normas pertinentes a contratação de tais empresas”.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS UTILIZADAS
BAUMAN, Zygmunt. Liquid Times: Living in an Age of Uncertainty. Cambridge: Polity Press, 2007.
CAMPOS, Carlos Alexandre de Azevedo. Dimensões do ativismo judicial do Supremo Tribunal Federal. Rio de Janeiro: Forense, 2014.
CAMPOS, Roberto. A Lanterna na Popa. Rio de Janeiro: Topbooks, 1994.
Coase, Ronald H. A Firma, o mercado e o direito. Tradução de Heloisa Gonçalves Barbosa. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2016.
ENGISCH, Karl. Introdução do pensamento jurídico. 2. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1964.
HÄBERLE, Peter. El Estado Constitucional . Trad. Héctor Fix-Fierro. México D.F: Universidad Autónoma de México; 2001, p. 7
IBGE. Informalidade e comércio contribuem para queda no desemprego , disponível em:https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-denoticias/noticias/19163-informalidade-e-comercio-contribuem-para-quedano-desemprego
MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. A reforma trabalhista no Brasil = Labor reform in Brazil. Revista de direito do trabalho, São Paulo, SP, v. 43, n. 181, p. 19-29, set. 2017. OIT, World Employment Social Outlook: Trends 2018.
MIRANDA, Fernando Hugo R. A constitucionalização dos direitos sociais trabalhistas nas constituições brasileiras. Revista Ltr: legislação do trabalho, São Paulo, SP, v. 80, n. 12, p. 1470-1481, dez. 2016.
RAND, Ayn. A Revolta de Atlas. Editora Arqueiro: São-Paulo, 2010.
The World Bank. Policies to reduce informal employment: an international survey.
FUNDAMENTOS DO VOTO DO MIN. MARCO AURÉLIO (DIVERGÊNCIA)
Inconstitucionalidade formal
Compreende a inconstitucionalidade formal do diploma, uma vez que “embora seja garantida a autonomia do Legislativo para alterar, via emenda, ou rejeitar a proposta, não se lhe dispensa a deliberação quanto ao pedido formulado”.
Inconstitucionalidade material
Direito do Trabalho e mudanças socioeconômicas
Compreende que para a adequada compreensão da matéria é necessário revisitar a história do Direito do Trabalho. A origem do ramo advém da necessidade de realizar uma justiça social ao proteger o hipossuficiente. Uma flexibilização nas normas trabalhistas viabiliza que o trabalhador seja uma “vítima de mercado de trabalho impiedoso”. O ministro traz uma retrospectiva da terceirização na legislação brasileira. Posteriormente, aponta que na década de 1990, quase a totalidade das nações, sob a globalização e ideários neoliberais, começaram a realizar o processo de desregulamentação do mercado de trabalho. Tendo em vista a necessidade de se alinhar a realidade, a terceirização foi utilizada, nos termos da legislação, de forma excepcional. Apesar da necessidade do Direito se adequar ao mundo globalizado, a restrição jurisprudencial decorre do princípio da proteção ao trabalhador, consequência do processo de constitucionalização dos direitos dos trabalhadores e da preocupação do constituinte na tutela dos trabalhadores.
Atividade-fim versus atividade-meio
O ministro entende que o magistrado deve atuar conforme os princípios gerais do Direito e, em questões pertinentes ao Direito do Trabalho, considerar a história protetiva do ramo, sob pena de “subverter-se aquilo que é o fundamento e a razão de ser da Justiça trabalhista”. O julgador não só deve atentar-se ao “que é mais próprio ao Direito do Trabalho, ou seja, a disparidade jurídica na qual se encontram as partes contratantes, ante as particularidades de cada situação e o momento vivido”, mas também ao fato que “protetivo não é o julgador, mas a própria legislação trabalhista”.
Súmula 331 do TST
Ao citar Gabriela Delgado, demonstra a “vulneração de diversas garantias dos trabalhadores em virtude da dissociação entre a relação econômica de trabalho e o vínculo empregatício correspondente”. Aponta também que o tratamento inferior aos terceirizados é incompatível com a garantia da isonomia remuneratória prevista no art. 8º, inc. XXX da CRFB/88. No âmbito coletivo, o terceirizado não integra a categoria profissional, constituindo um grupo heterogêneo de representação diminuindo o poder de reivindicação, revelando um “apartheid sindical”. Como também aponta, conforme disposto por Renata Dutra, “uma desintegração da identidade coletiva dos trabalhadores mediante o enfraquecimento dos laços de pertencimento”. Além disso, ressalta que a terceirização irrestrita viola a Recomendação nº 198/2006 e a Convenção nº 155 da OIT.
Terceirização e concurso público
É consolidada a admissão da terceirização em atividades auxiliares ou de apoio administrativo, de modo que “qualquer forma de utilização, pela Administração, do serviço temporário ou terceirizado para burlar a regra constitucional do concurso público encontra óbice no ordenamento e na jurisprudência do Tribunal. Precedente: ação direta de inconstitucionalidade nº 890, relator ministro Maurício Corrêa, com acórdão veiculado no Diário de Justiça de 6 de fevereiro de 2004”.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS UTILIZADAS
DELGADO, Gabriela Neves et al. Os limites constitucionais da terceirização. 2. ed. São Paulo: LTr, 2015.
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2002.
DUTRA, Renata Queiroz. Direitos fundamentais à proteção da subjetividade no trabalho e emancipação coletiva. In: DELGADO, Gabriela Neves; PEREIRA, Ricardo José Macêdo Britto (Orgs.). Trabalho Constituição e Cidadania : a dimensão coletiva dos direitos sociais trabalhistas . São Paulo: LTr, 2014.
PEREIRA, Ricardo José Macêdo Britto. Terceirização, a CLT e a Constituição . Disponível em: http://trabalho-constituicao-cidadania. blogspot.com/2013/. Acesso em: 20 de agosto de 2018.
PORTO, Lorena Vasconcelos. A Terceirização na Reforma Trabalhista e a Violação às Normas Internacionais de Proteção ao Trabalho. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, Belo Horizonte, v. 63, n. 96, p. 177, jul./dez. 2017.
FUNDAMENTOS DO VOTO DO MIN. EDSON FACHIN (DIVERGÊNCIA)
Inconstitucionalidade material
Direito do Trabalho e mudanças socioeconômicas
O ministro cita o voto proferido pelo Ministro Marco Aurélio no julgamento da ADPF 324 e do RE 958252, o qual entende que “o Direito não deve fechar os olhos diante da realidade globalizada do mercado de trabalho do início do século XXI, altamente especializado e em constante mutação”. Porém, a restrição à utilização da terceirização decorre do princípio da proteção que subsidia o ordenamento jurídico-trabalhista, visto que a constitucionalização dos direitos dos trabalhadores revelou uma preocupação do constituinte em proteger a parcela hipossuficiente da relação trabalhista. Desse modo, o princípio é “a baliza hermenêutica a ser observada pelo intérprete, revelando-se a óptica a partir da qual o instituto da terceirização deve ser compreendido”.
Atividade-fim versus atividade-meio
Quanto à terceirização de serviços em atividades-fim, a pretensão da flexibilização da contratação de mão de obra viola elementos estruturantes do Estado Democrático de Direito. Demonstra ainda que “tal percepção é contrária, ainda, à evolução histórica e jurisprudencial da terceirização, inclusive em âmbito internacional”.
Súmula 331 do TST
Em primeiro lugar aborda o significado de uma súmula como a consolidação de um entendimento pacífico ou ao menos majoritário de um colegiado em determinada matéria contida em sua competência, com o objetivo de conferir maior segurança jurídica as suas decisões a dos órgãos a ele subordinado. A Súmula 331 do TST, dessa forma, “manifesta o entendimento daquela Justiça Especializada, no que concerne à terceirização de mão-de-obra. Há, então, efetivo exercício interpretativo que toma como ponto de partida a base legislativa existente para o correto enquadramento da questão”, função típica do Poder Judiciário. Não incorre, assim, em violação ao princípio da legalidade pela Justiça do Trabalho.
Consequências da intermediação da mão de obra
Destaca o voto do Ministro Ricardo Lewandowski no julgamento da ADPF 324 e do RE 958252, o qual considera a terceirização irrestrita uma forma de desconfigurar o regime clássico de emprego “sob pena de esvaziamento da eficácia de direitos e garantias fundamentais dos trabalhadores”. Além disso, por meio de dados empíricos, Lewandowski apresenta a alta rotatividade, a repercussão negativa nos direitos incidentes do salário, o aumento da intensidade da jornada e a fragilização da representatividade sindical.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS UTILIZADAS
CARELLI, Rodrigo de Lacerda. Terceirização e intermediação de mão-de-obra na administração pública. In: Revista LTR : Legislação do Trabalho, v. 67, n. 6, p. 687, jun. 2003.
DELGADO, Gabriela Neves; AMORIM, Helder Santos. Os limites constitucionais da terceirização. São Paulo: LTr, 2014.
PEREIRA, Ricardo José Macêdo Britto. Terceirização, a CLT e a Constituição . Disponível em: http://trabalho-constituicao-cidadania. blogspot.com/2013/. Acesso em 20 de agosto de 2018.
FUNDAMENTOS DO VOTO DO MIN. RICARDO LEWANDOWSKI (DIVERGÊNCIA)
Inconstitucionalidade formal
Entende que a “Lei 13.429/2017 padece do vício da inconstitucionalidade formal, pela ausência de deliberação sobre requerimento de retirada do Projeto de Lei 4.302/1998, formulado pelo Presidente da República, por meio da mensagem 389/2003 (documento eletrônico 15 constante da ADI 5.685/DF)”.
Inconstitucionalidade material
Direito do Trabalho e mudanças socioeconômicas
Em primeiro lugar, aponta que a terceirização surgiu na Segunda Guerra Mundial nos Estados Unidos. Após o período de guerra, o modelo teve sua utilização expandida. Em meados dos anos 80, houve a implementação do Toyotismo, elemento nuclear da terceirização, caracterizado por empregos precários, flexíveis e concentrados no processo produtivo. No mesmo contexto, o mercado interno brasileiro estava propício a descentralização. Apesar da escassa normatividade, foi ganhando força no mercado de trabalho. O Tribunal Superior do Trabalho, em um primeiro momento, considerou ilegal e permitiu somente nos casos permitidos em lei. A posterior edição da Súmula 331 do TST demonstra que a utilização não deveria se afastar das hipóteses legais de descentralização e preceitos insculpidos pela CLT.
Atividade-fim versus atividade-meio
A possibilidade de utilizar a terceirização em atividade-fim constitui desrespeito “aos elementos estruturantes do Estado Democrático de Direito e constitui abuso flexibilizador da contratação de mão de obra, pois viola as clássicas garantias trabalhistas conquistadas ao longo do processo histórico de afirmação dos direitos sociais, o que representaria um verdadeiro retrocesso jurisprudencial”. Além disso, destaca que é uma fraude às relações de emprego e um apelo ao setor empresarial de ampliar a contratação a partir do próprio interesse.
Súmula 331 do TST
Como consequência de toda a precarização, a Justiça do Trabalho, pela predileção do princípio da proteção das relações de emprego, resistiu às pressões do mercado. Ao remanejar a terceirização somente para atividades-meio, a súmula flexibilizou a relação de emprego, mas manteve o dever do Estado de proteção social ao trabalhador. O Ministro fundamenta sua visão a partir do voto do Ministro Marco Aurélio de Mello, que deu origem ao enunciado 256 do TST, em que “percebe-se, claramente, o feixe protetivo da relação de emprego arraigado na legislação e jurisprudência trabalhista brasileira, como eficiente obstáculo interposto à generalização desenfreada dos artifícios do sistema econômico capitalista”.
Consequências da intermediação da mão de obra
“A prática observada no dia a dia dessas relações terceirizadas ressalta que, apesar da roupagem formal empregatícia, diversos elementos estruturantes da relação de emprego tornam-se frágeis”. O ministro ressalta que a alta rotatividade gerada pela modalidade prejudica o recebimento de verbas trabalhistas e o direito às férias. Como também, demonstra que há uma redução do nível remuneratório do trabalhador terceirizado, consequentemente, afetando o poder de compra e repercutindo de modo negativo sobre “todos os demais direitos incidentes sobre a remuneração (décimo terceiro, férias acrescidas do terço constitucional, FGTS, adicionais, gratificações etc.), precarizando substancialmente a condição social do trabalhador”.
Flexibilização e direito comparado
Ressalta que diversos países adotaram a referida forma, mas estabeleceram um patamar mínimo de regulamentação com vista a proteger a clássica relação de emprego, diferentemente do Brasil. Desse modo, “animou a interpretação jurisprudencial prevista na Súmula 331 do TST, atenta a minimizar os subterfúgios advindos de um mecanismo que excepciona e vulnerabiliza o regime de proteção social.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS UTILIZADAS
Não foram utilizadas referências bibliográficas.
FUNDAMENTOS DO VOTO DA MIN. ROSA WEBER (DIVERGÊNCIA)
Inconstitucionalidade material
Direito do Trabalho e mudanças socioeconômicas
Salienta que a Consolidação das Leis do Trabalho estabelece como regra o contrato de trabalho direto entre empregado e empregador, sendo contrária a qualquer forma indireta e intermediada de contratação que se coloque como regra. O texto normativo se vincula ao ideário da Organização Internacional do Trabalho (OIT), o qual “preconiza que o trabalho humano não é mercadoria, não podendo ser negociado ou intermediado, mas contratado diretamente por seu próprio titular: o trabalhador”. Por sua vez, a Constituição Cidadã de 1988 foi desenvolvida a partir dos parâmetros de proteção ao estabelecer, por exemplo, que a livre iniciativa deve respeitar os limites da legislação trabalhista.
Atividade-fim versus atividade-meio
Destaca que o STF deve “rechaçar toda e qualquer forma de alteração legislativa que pavimente o caminho para sujeição dos trabalhadores, mediante a terceirização, a condições degradantes e de exploração”. A liberalização da atividade-fim “longe de interferir na curva de emprego, tenderá a ‘nivelar por baixo’ o mercado de trabalho, expandindo a condição de precariedade hoje presente nos 26,4% de postos de trabalho terceirizados para a totalidade dos empregos formais”.
Súmula 331 do TST
A ministra cita seu o voto e o dos ministros Edson Fachin, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio na ADPF 324 e do RE 958252, ressaltando a controvérsia sobre a violação ou não do art. 5º, inc. I da Constituição Federal pela Súmula 331 do TST, uma vez que a restrição promovida à terceirização violaria princípios e fundamentos constitucionais. Ao entender a não violação, denota que a referida súmula nasceu de um processo de consolidação da jurisprudência trabalhista, adequando as normas de proteção ao trabalhador com a modalidade de intermediação da mão de obra.
Consequências da intermediação da mão de obra
Entende que “a terceirização desvirtua a relação bilateral de emprego, com consequências inadmissíveis aos direitos sociais e à proibição do retrocesso, em razão da evidente pretensão reducionista que lhe é ínsita”. Ela evidencia que a modalidade irrestrita “significa chancelar, à margem da lei, a mercantilização do trabalho humano, configuradora de repugnante exploração do homem pelo homem e desprestígio da lei pátria e da Constituição da República”.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS UTILIZADAS
LOPES, Ana Frazão de Azevedo. Empresa e Propriedade – função social e abuso de poder econômico. São Paulo: Quartier Latin, 2006.
LIVROS, ARTIGOS E OUTRAS PRODUÇÕES CIENTÍFICAS
DUTRA, Renata Q.; FILGUEIRAS, Vitor. A terceirização no STF e a utopia da direita. Disponível em: https://www.justificando.com/2020/07/02/a-terceirizacao-no-stf-e-a-utopia-da-direita/. Acesso em 06 de outubro de 2020.
Elaboração de Bianca Matos, com apoio da equipe do Observatório Trabalhista do Supremo Tribunal Federal.
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